Obras da Petrobras sobre investigação, acompanhe na reportagem do Fantástico.
Fonte: http://g1.globo.com/fantastico/videos/t/edicoes/v/obra-de-usina-no-rs-esta-parada-ha-25-anos/2330039/
Um assunto que, este ano, o
Fantástico vai acompanhar com muita atenção: os gargalos da infraestrutura no Brasil.
O Show da Vida vai falar de portos, usinas, ferrovias, estradas, que são
fundamentais para o país crescer e gerar empregos.
Você vai ver como bilhões de
reais são desperdiçados por falta de um bom planejamento. E quem paga essa
conta, no final, é você!
Nunca ficou pronta, e parece
em ruínas. Há tanto tempo abandonada, que do fosso sobe uma árvore adulta. E
muita coisa aconteceu no Brasil desde que o projeto começou.
O início foi ainda no regime
militar. Veio o movimento Diretas Já, a morte de Tancredo Neves, o vice, José
Sarney, virou presidente - e começaram as obras. Vieram as primeiras eleições
diretas - e Fernando Collor parou as obras por falta de verbas. Veio o governo
Itamar Franco.
Depois, Fernando Henrique
Cardoso privatizou o setor elétrico, e com ele a usina. O primeiro operário
presidente, Lula. A primeira mulher presidente, Dilma. E as obras da usina de
Jacuí 1, a 60 quilômetros de Porto Alegre, nunca foram terminadas.
Nos depósitos mostrados em
vídeo, estão os equipamentos, importados da Alemanha em 1987 pelo equivalente
hoje a R$ 500 milhões.
Uma usina completa, com
capacidade para abastecer toda a região metropolitana de Porto Alegre,
empacotada dentro de galpões há 25 anos.
Instalada, poderia gerar 360
megawatts/hora de energia. Geradores de vapor, turbinas e painéis de controle
nunca registram um kilowatt sequer.
A manutenção é feita pela
antiga dona, a empresa Tractebel, que comprou a usina em obras na privatização
da estatal Eletrosul. A Tractebel afirma que depois vendeu a usina, mas não
recebeu o pagamento. O caso está na justiça.
Segundo a Tractebel, os
equipamentos são a garantia da dívida. Mas mesmo em bom estado, a possibilidade
de que um dia gerem energia são cada vez menores.
Meio bilhão de reais que
podem virar ferro velho, se a termoelétrica não for concluída.
“Na verdade, ela seria
sucateada. Seria quase vendida a peso de ferro e dos outros metais que existem
no lugar”, disse o procurador dos proprietários da usina, Marco Antônio de
Costa Souza.
Na época, parecia o plano
perfeito pra se aproveitar uma riqueza abundante da região, que está toda sobre
um lençol de carvão mineral, a menos de 15 metros de profundidade. Mas o que
levou Jacuí 1 às ruínas não foi o fato de que o carvão se tornou o inimigo
número um do aquecimento global. Foi uma sequência de compras e vendas mal
sucedidas.
Investidores que compraram,
mas não pagaram a usina, acabaram presos por falsificar documentos para pegar
empréstimo no exterior. Depois, a usina foi parar na mão de uma empresa de
previdência privada americana, que faliu.
“Dificilmente se iniciaria
um projeto como esse hoje. Mas, no estágio em que se encontra, eu acho um
desperdício imenso não se terminar essa obra. Nós temos 70% das obras civis
prontas. A usina está praticamente toda
aqui estocada”, explica o procurado. Marco Antonio Costa Souza.
O administrador da massa
falida acrescenta que, com um investimento de mais meio bilhão, a usina poderia
gerar energia.
Fantástico: Existe chance da
usina sair?
“Muito pequena de que essa
usina fique pronta, porque são praticamente 22 anos de espera”, disse o
prefeito de Charqueadas, Davi Gilmar de Abreu Souza
Durante décadas a região se
mobilizou para que a usina fosse terminada. Agora, a prefeitura tem outros
planos. Desapropriou boa parte do terreno para fazer um polo industrial.
Sobre o dinheiro público
enterrado no lugar, ele afirma: “A gente não sabe em quanto que está essa
conta. E é dinheiro público. Isso dói. É dinheiro do contribuinte, do cidadão
brasileiro que foi investido nesse projeto de Jacuí 1 que não saiu de onde
está”.
Parques eólicos estão com
hélices paradas no Nordeste
A 2,6 mil quilômetros, no
sertão da Bahia, há outro exemplo de desperdício. No lugar, o recurso abundante
é o vento. Basta ver as árvores, que crescem curvadas. E, nas serras da região
de Caetité, torres com turbinas eólicas, que poderiam gerar energia limpa e
barata, brotam às centenas sobre a caatinga.
O Nordeste já tem instalados
e prontos para funcionar parques com capacidade para abastecer uma cidade do
tamanho de Brasília. Mas as hélices estão paradas. E não por falta de vento.
Os parques ficaram prontos
em julho, bem a tempo de ajudar o Brasil a enfrentar o período das secas,
quando os reservatórios das hidrelétricas ficam mais baixos. Só que até agora
nem um kilowatt produzido no lugar entrou na rede. Simplesmente porque as
linhas de transmissão, que deveriam entregar a energia de lá até o sistema, não
foram construídas.
Várias empresas privadas
investiram R$ 1,2 bilhão nos parques eólicos.
“Enquanto isso não é
escoado, os parques têm que ficar parados. Tem uma manutenção especial,
custosa, pra poder manter a máquina que foi feita pra girar, ela ficar parada”,
disse o diretor presidente da Renova Energia, Mathias Becker.
Por contrato, como
terminaram a construção no prazo, as empresas estão recebendo do governo pela
energia que poderiam gerar R$ 33,6 milhões por mês. De julho a outubro, foram
R$ 134,4 milhões. E, segundo a Aneel, deve passar dos R$ 440 milhões até
setembro, quando as primeiras linhas deverão ficar prontas. Esse dinheiro sai
da sua conta de luz.
Cabos enrolados no local
indicam literalmente um fim de linha. Toda a energia produzida pelos parques
eólicos da região já poderia chegar até o lugar. Bastaria os cabos cruzarem a
estrada pra chegar a uma subestação que deveria ter sido construída em um
terreno onde o mato ainda está crescendo. Do ponto mostrado em vídeo até a
linha principal pra se conectar ao sistema nacional, são 120 quilômetros. Só
que as obras ainda nem começaram.
A responsável pela linha é a
Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf). O diretor de engenharia da
empresa diz que a culpa é da demora nos licenciamentos ambiental e do
patrimônio histórico. Mas a Aneel entendeu que a Chesf geriu mal os prazos, e
multou a empresa em R$ 12 milhões - o que dá menos de 10% do prejuízo acumulado
até agora.
A Aneel informa que vai cobrar
esse dinheiro da Chesf.
Fantástico: A Chesf é também
uma empresa pública?
“A Chesf é uma empresa de
economia mista”, disse o diretor de Engenharia e Construção da Chesf, José
Aílton de Lima.
Fantástico:Com maioria
controladora do poder público. O contribuinte brasileiro. Se a Aneel ou a Chesf
pagarem o prejuízo, de qualquer maneira o prejuízo sai do consumidor.
“De Todo jeito.Se fosse
privada também. Quem paga a conta é sempre o consumidor de qualquer jeito. No
momento em que a energia não tiver lá, não tiver saindo da usina, o consumidor
vai estar pagando”, disse o diretor.
Especialistas apontam as
linhas de transmissão como o ponto crítico do sistema elétrico brasileiro hoje.
“Quando hoje nós observamos
alguns apagões aqui e ali, isso quer dizer subinvestimento nas redes,
subinvestimento na rede de transmissão. Não adianta você ter geração e ter
distribuição se você não tem aquele meio que é a transmissão de energia”,
explica o especialista em infraestrutura Cláudio Frischtak.
No Brasil inteiro, 58 linhas
de transmissão estão com as obras atrasadas em pelo menos quatro meses; 21 são
de responsabilidade da Chesf. Em outras cinco a Chesf faz parte do grupo
construtor.
Repórter: A empresa não
tentou dar um passo maior que a perna? Ou pegar muitas concorrências, muitos
leilões sem conseguir entregar as obras?
Diretor: A empresa que não
tentar dar um passo maior que a perna não é uma empresa, é outra coisa. Toda
empresa que se preza dá um passo maior que a perna. E nós vamos continuar dando
passo maior do que a perna. Isso pra mim não é problema.
Neste momento, o Brasil não
pode desprezar energia. Está usando todas as usinas térmicas, por causa dos
reservatórios baixos nas hidrelétricas.
Sobre o risco de apagão que
o Brasil corre, Cláudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, afirma:
“Depende de que horizonte você está olhando. Se você olhar a realidade hoje,
não. Hoje não estamos correndo esse risco de maneira dramática como corremos
por exemplo em 2008. Mas se olharmos pra frente, supondo que o Brasil volte a
crescer a taxas que todos desejamos, então nós temos que olhar pros problemas
que estão acontecendo como indicadores de que há um risco, sim”, disse o
presidente do Instituto Acende Brasil, Cláudio Sales.
“No momento eu diria que a
gente não corre o risco de falta de energia. O risco que a gente corre é dessa
energia ser progressivamente muito cara”, diz o ex-presidente da Eletrobrás,
José Luiz Alquéres.
Outra energia indispensável
é combustível. A frota de veículos mais do que dobrou em dez anos. Somos
autosuficientes em petróleo, mas precisamos importar cada vez mais gasolina,
por falta de refinarias.
Um imenso complexo
petroquímico, na região metropolitana do Recife, a Refinaria do Nordeste, A
Abreu e Lima, deveria resolver parte do problema. Só podemos mostrar imagens de
helicóptero, porque a Petrobras não permitiu o acesso ao canteiro de obras,
alegando falta de segurança. Pelo projeto inicial, ela já deveria estar
funcionando.
Só que as obras estão com
dois anos atraso. E com essa demora, os custos também se multiplicaram. Em
2005, quando foi aprovado o orçamento para a construção, era de R$ 4,7 bilhões.
Em agosto do ano passado, ele foi revisto pela Petrobras para 41,2 bilhões. Um
aumento de mais de oito vezes e meia.
Numa cerimônia no ano passado,
a presidente da Petrobrás disse que o caso da refinaria deveria ser estudado e
nunca mais repetido.
“As razões são muitas. Erros
de planejamento, erros de projeto, entrega de equipamento atrasado. Então, tudo
isso está colaborando pro preço duplicar, triplicar, multiplicar por 20”, disse
o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura, Adriano Pires.
Mas a Petrobras diz que
houve muitas mudanças no projeto, e não dá para usar o preço inicial como
referência.
“É uma referência a um
projeto muito diferente do projeto que esta sendo implementado”, diz o
gerente-executivo de engenharia e abastecimento, Mauricio Guedes.
Segundo a Petrobras, a
refinaria terá capacidade para produzir também outros combustíveis com nova
tecnologia ambiental.
Então, um projeto diferente,
sendo implantado num cenário diferente, num contexto diferente.
Mas o relatório Fiscobrás,
editado pelo Tribunal de Contas da União, aponta irregularidades.
A terraplenagem teria sido
superfaturada em R$ 90 milhões. Outros cinco contratos têm sobrepreço, ou seja,
serão pagos preços muito acima do mercado.
Segundo o TCU, nesses cinco
contratos o prejuízo para os brasileiros, todos sócios da Petrobras, chega a R$
1,380 bilhão. A Petrobras não acatou a recomendação de paralisar as obras e
refazer os contratos.
“Paulatinamente, nós temos
esclarecido todas as irregularidades ou supostas irregularidades apontadas pelo
TCU. E até hoje não existe julgamento sobre nenhuma irregularidade que tenha,
em definitivo, sido constatada como tal pelo TCU. Até hoje conseguimos
esclarecer a maior parte delas. Tem uma pequena parte que a gente ainda precisa
esclarecer. E essa discussão continua”, disse gerente-executivo de engenharia e
abastecimento, Mauricio Guedes.
Para especialistas no setor
do petróleo, as causas do aumento de custos são muitas.
Abreu e Lima começou errada
desde o momento que foi escolher o sócio
que foi a PDVSA da Venezuela. Até hoje a PDVSA não colocou
um tostão na obra. No Rio de Janeiro, a Petrobras constrói outro complexo petroquímico,
o COMPERJ - também atrasado, e também com indício de sobreço apontado pelo TCU.
O contrato de implantação de uma tubovia está R$ 163 milhões acima do preço de
mercado.
Um exemplo de falha de
planejamento ocupa um grande espaço no porto do Rio. São 13 equipamentos -
todos muito grandes e muito pesados para passar nas estradas existentes.
Estão no pátio há um ano e
meio, porque não tem como ser transportados até o complexo petroquímico.
Precisam atravessar a Baía
de Guanabara, chegar à Praia da Beira, em São Gonçalo.
Mas no lugar não há sinal de
obras para construir o píer onde os equipamentos serão desembarcados. Para ser levados por uma
estrada especial - que ainda não existe - até a obra do Comperj. A Petrobras não informa
quanto está pagando pelo espaço ocupado no porto. Mas o Fantástico apurou que
esse valor está na casa dos milhões de reais.
A poucos quilômetros de
Caetité, no sertão da Bahia, bem perto das usinas eólicas paradas que mostramos
no início desta reportagem, mais uma noite chega escura para Dona Luiza.
“Eu sento aqui na calçada de
noite no escuro sozinha, só mais Deus, olhando. A gente já acostumou. Tudo no
escurinho. Tem vez que a tem lamparina. Tem vez que não tem. Não tem nem pra
comprar o óleo para colocar nela. Fazer o que? Não tem novela, porque não tem
energia”, conta a agricultora Dona Luiza.
A eletricidade ainda não
chegou a mais de um milhão de lares no brasil. A agricultora não tem o dinheiro
para puxar os fios, a 500 metros de casa.
Ela conta o que vai querer
colocar em casa, quando tiver energia: “só uma geladeira pra guardar as
comidinhas. Às vezes, sobra um pouquinho que tem que botar na geladeira. Por
que a gente não tem a geladeira, sobrou tem que jogar fora”.
À luz da lamparina, ela
sonha. “Tem que sonhar mesmo. Sonhar sempre. Um dia vai chegar. Fé em Deus”,
diz a agricultora.
O Fantástico tentou por três
semanas uma entrevista com o Ministro de Minas e Energia, mas não foi atendido.